sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Pecado...

Bem sei que debelo a qualidade das minhas emoções e me afasto do Céu permitindo-me ao mau feitio e embirração mas, sob pena de ser definitivamente excomungado dos círculos doutrinários vigentes, Deus e os leitores permitam-me mais um dos meus pecados.

É que nunca cheguei a perceber o porquê de, por exemplo, toda a gente falar mal do Sócrates – não que eu fale melhor – quando tratando-se de certos outros indivíduos da praça com os quais temos que levar, emitir opinião é embarcar numa viagem pela origem do prurido opinativo.

Note-se que, assumidamente, sobre o que aqui me trás hoje, até sou dos que têm telhados de vidro. Mas que importa isso se nos dias que correm já detesto ter razão e contratar-me só o fazem os que me valorizam no talento e competência, não pelos meus olhos que, por sinal, tratando-se de trabalho, são de carneiro mal morto.

Mas adiante: Tive ontem uma acalorada conversa na qual uma lançada jornalista nacional equiparava a qualidade dos artigos de opinião do Ricardo Araújo Pereira à virtude dos produzidos pelo Fernando Alvim. Na minha humilde opinião, igualar o primeiro ao segundo é como tecer elogios igualitários à capela dos Jerónimos e à igreja da Medrosa. Note-se que, a segunda, embora bem frequentada mais parece um escarro cuspido pela flatulência de um mestre de obras amigo do bispo local.

Continuando. Ainda me pergunto se, para elegia de alguns, a minha amiga não consegue reconhecer a diferença abissal existente entre o saber-se vender fortemente a própria imagem e a legitima proclamação do talento? A diferença entre ensaiar o riso para cair oportunamente nos ciclos sociais em voga e o rir genuinamente nem que seja da estupidez alheia? Em boa verdade, quando solicitado a opinar, um limita-se a seguir aos sss numa gloriosa tentativa de evitar futuras barreiras sociais, ou seja, cobra pela opinião a opinião que não emite e o povinho aplaude por não se sentir confrontado, enquanto o outro, a quem muitos gostariam de poder pagar para que deixasse de a emitir com tanto garbo, a escancara, sendo aplaudido na mesma por dizer o que na nossa cobardia raramente temos colhões para verbalizar publicamente. E não é por isso que tem os bolsos mais vazios, pelo contrario.

Ainda dentro dos parâmetros da minha parca opinião, que a pouco mais do que à ponta dos meus dedos chega e pela minha pequenez me coloca a cabeça a prémio, aquilo a que tenho assistido é: No caso do primeiro, as hostes fazem vigílias aguardando a próxima aparição, ao invés de, como acontece no segundo caso, os desbocados soltarem um inconsciente “epá, mas temos que levar com este outra vez?”. E olhem que, apesar de papar com tudo, o povo também sabe.

Por bem existe espaço para tudo e para todos, se não existissem os ditos “picha mole” os com tesão nunca sobressairiam, e sobre gostos, politica e religião é de bom tom não se discutir, porque, tal como eu, ao fazê-lo, peca-se.

Confesso que até já tentei dar o benefício da dúvida ao FA, mas tal como evidenciado por comparação nos links coloridos o que me acontece é ler um artigo dele e ficar com a sensação de que, sem acrescentar valor cívico, político, ou cultural ao discurso, fala, fala, fala numa prosápia estéril, pretendendo-se piadético, não indo além do politicamente correcto e, sem dizer nada, acaba por rematar o discurso com um arrepiante esgar de falsa ingenuidade. Acerca do RAP, digam-me vocês.

Mas será que só eu é que vejo as coisas assim, que se perguntasse a um adolescente o motivo do sucesso do FA ele, abanando a mão à frente dos olhos me atiraria com um “deahhea”?

É que já me enfada esta história de, após tempos vencidos, ter que continuar a perguntar: E então, o maluco era eu, hem ?

Se me disserem o que é que o FA quer dizer com isto, talvez mude de opinião:

“...Daí que olhando para trás, é isto que vos posso dizer, mas se olhar para baixo, fixamente nos pés, são as sapatilhas Sanjo que me lembro…””…porque só elas me faziam fazer golos iguais aos do Nené, camisola número 7, eu mesmo nas costas, ali ia Nandinho com as suas Sanjo, rotinhas,…”

Não me melguem...

PBC

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Foto PBC

O que se segue, para além de estilística e tematicamente poder ser do seu desagrado, poderá também conter algumas gralhas e erros ortográficos ou semânticos, imperfeições que algum corrector de texto poderia eliminar, disfarçando assim tamanha dislexia em impoluta ortografia, pelo que, se acaso for dos que atenta nessas coisas, sugiro: Não avance mais. Continuar será desrespeitoso para mim e para si. Lê-lo, será sempre opção sua. Se avançar e chegar ao fim, apetecendo-lhe, leve o que quiser, mas faça-o em silêncio. E peço-lhe o favor, ao sair, no máximo, feche a porta. Faça do que levou o que melhor entender mas, sobre tudo, não devolva o que não lhe servir.

Não escrevo para outro alguém que não para mim mesmo. No fazê-lo, antes de aprovação ou entendimento alheio urge-me tão só o entender-me no sentir dos termos reverberando-me nas entranhas, na espacialização fonética dos significados e significantes passíveis de os cartografar terminologicamente e em concordância com a génese que em mim deles se alimenta.

Neste espaço ou outro dentro das paredes da minha casa jamais subjugarei a verdade da minha expressão escrita a formalismos que a remetam para o enclausuramento hermético de alguma torre de marfim, que não a pretendo perfeita mas exclusivamente sentida, que não a pretendo em lógica comum mas simplesmente intima, que não a creio para deleite ordinário mas mormente pessoal, que não a ambiciono do agrado geral mas arredada do momento, despida de tempo.

Que me enfadam sentenças ortograficamente imaculadas mas paridas sem alma, desenxabidas. Que as prefiro bastardas, porém, que a esta e só a esta pele se cravem, que me nascem egoístas. São-me como as musas. Por norma, em detrimento das estereotipadas encantam-me algumas fisicamente imperfeitas e, vá-se lá saber o porquê, ainda que a mais ninguém emocionem, aceleram-me o sangue.

Assim não fossem não eram minhas as minhas palavras. Teria eu outra identidade, essa que nem pela forma nem pelo conteúdo a/as amordaçará ou falseará na personalidade. Doer-me-ia enganá-las no jeito de me acontecerem, como se sendo coxo me doesse a exigência de não mancar ao correr além.

Se por tanto não as consentisse, não me serviriam, nem elas de mim.

Nem eu aqui assim.

PBC

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

...mas amor...


Intuiu a existência da eternidade quando logo pela primeira vez a viu e, de todas as outras vezes que a encontrou pouco mais do que a confusão e uma estranha saudade o venceu.

Nem sequer pensava nisso e mal entendia o porquê de lhe parecer que, apesar da diferença de idades, dos mundos distantes e serem completamente desconhecidos um do outro, conquistava-o uma impalpável certeza, a de se conhecerem desde sempre. Não o corpo, não o rosto, mas o que a domiciliava era-lhe familiar.

Era ainda ela a pureza da adolescência e ele já homem rodado quando, por vezes, ao encontrá-la, sem se aperceber, ao cumprimentá-la, como se acaso se tratasse de alguém ao lado de quem acordara; o espaço que entre eles se abria; ao invés do cordial olá; conduzia-o a um natural ensejo de a beijar nos lábios.

Vê-la era reconhecer as ironias do tempo no labiríntico cruzamento das almas, era desfigurar as razões da matéria na ilusão do conhecido, era sentir-se preso a um corpo atraído pelo que o âmago reclama numa silenciosa reciprocidade de encantamentos, era mergulhar na ausência de passados presentes e futuros as sentenças mortais tombando perante a intemporalidade da consciência, era o amor sem outros preceitos que não o deixa-lo fluir sem reticências ou condições.

Firmava-se-lhes uma certeza quando diante um do outro; ambos não cabiam nos próprios corpos, porque afastados pelas circunstâncias, as rangendo na carne a sorte do provisório. Nesses momentos eram simplesmente a antiguidade de duas almas isoladas pelos caprichos da perpetuidade e da demora, procurando-se, de forma que, quando por vezes se lembrava dela, em meio aos braços laços arrepelando o vazio e a um inaudível brado nidificando-lhe na garganta, como quem descansa pousando a cabeça numa nuvem de suspiros provava o verdadeiro sentido da solidão terrena.

Dias, meses, anos passaram-se sem que para eles se extinguisse a possibilidade do reencontro no qual todo o tempo do mundo pouco mais era que a voz distante das estrelas apontando-lhes o Zénite, e os dedos que, à noite, mesmo distantes, se procuravam na fantasia. Havia um eco desassossegado nas suas memorias, um fruir de silêncios que não se afirmavam pela ausência dos corpos apartados, a certeza de do outro lado o eco ter uma única nota de retorno, o contorno da espera no irresoluto desejo de vencerem a arbitrariedade dos lugares que os distanciavam.

Como o possível mas não aceitado preenchimento do espaço presente, à distância, entreolhavam-se por paixão, que não era, mas amor...

PBC