segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Herdada de mim.


Tenho memoria de elefante para factos da mais tenra infância e, hoje, olhando para a minha filha tentando adquirir autonomia no virar-se tive um flash back, daqueles onde uma vez mais fui atirado para um ponto preciso do meu mais remoto passado. Voltei aos cinco seis meses, àquela cama de grades de madeira bem escura onde lutei para conquistar a certeza de muitos movimentos autonomizadores como o virar-me e que, se em certos dias essa cama me oferecia o conforto da solidão e a possibilidade de mergulhar nos meus botões e exercícios primários de destreza física e intelectual noutros me fornecia uma impressão de reclusão, que me marcaria para o resto da vida. Obsevando a Laura perguntei-me se ela, um dia, tal como eu, se irá lembrar destes momentos. Lembrar-se destes momentos?!! Está parvo; dirão vocês; este gajo deve ser doido e se não excessivamente fantasista tem é a mania. Mas sabem, pouco me importa o vosso juizo. Aliás, já estou habituado a tais entendimentos das minhas capacidades. É que quando digo às pessoas que as minhas memorias remontam à mais tenra infância acham-no estranho e na maior parte das vezes duvidam da possibilidade. De facto a mim também não me é estranho que assim seja pois não são os outros e sim eu a ter um dos QI’s mais elevados do planeta. Quanto à Laura, embora já lhe tenha detectado laivos de grande inteligência preocupa-me o facto dela a poder ter semelhante à minha, já que gente como eu, por tal, frequentemente intimida, gera invejas, faz sombra e acaba a recolher-se no silencio e na solidão dum efervescente universo, muito próprio. Porque imbuído dum recorrente sentimento de se ser alienígena no próprio bairro a estupefacção diante da cegueira generalizada frente ao simples – e agora sou eu a achar estranho que assim seja – leva a ter um papel de observador nas situações que não requeiram real intervenção deixando o de participante para quem vive na sede de provar coisa nenhuma, ou somente o culto do ego. Confesso que quando assim acontece em nada me motiva participar de corriqueirices desprovidas de substancial interesse; para mim está claro. Que, e não porque queira mas por ser o inevitável a cumprir na passagem por esta vida, ser assim também me atira para caminhos onde gerar a imortalidade do sujeito através de perspectivas produzidas pelo raciocínio lógico, pelo ver por todas as células e pela sensibilidade dificilmente alcançável pelos demais, qual maldição, é a paga por ter nascido com uma estátua gravada na medula. É, é verdade, tenho a arrogância de o dizer na plena consciência de que muito poucos o disseram em vida e o alcançaram na morte.

Por todos estes motivos gostaria que na Laura, no tocante a inteligência intelectual, que a emocional vem por arrasto, não hajam semelhanças comigo e que, um dia, não venha a ser complicado para ela interrogar-se do porquê de, em meio a uma gélida sensação nos poros gritando perplexidade: “como é possível não verem, não saberem, não imaginarem nem se aperceberem do simples óbvio desenhando gestos no ar em torno?".

Por isso esta grande e egoísta hambição de que a minha filha continue a virar-se no tapete mas sobre tudo aprenda a não ir ao tapete e sim a virar-se na vivencia de quem, herdada de mim, é.

PBC

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Com os olhos da alma.


Por vezes, quanto ao comportamento e expressão humana, como tábua de salvação para certezas e dúvidas agarro-me ao amor, quando não ao raciocínio lógico, à análise e ao estudo, como se no simples fazê-lo fosse capaz de me sobrevir a acalmia do chão que piso ou mera dissipação de quezílias com que me atiçam demais. Mas de nada me adiantam tais rasgos de inteligência e sentimento pois quanto mais os vejo com os olhos da alma mais questiono o que me dizem os do corpo.

PBC