quarta-feira, 26 de maio de 2010

Silhueta...


Sei que amanhã, ao olhar as nuvens despedaçando a linha do horizonte dobrarei a esquina do sonho e, do breve murmúrio do desejo com que desenho na pele a silhueta do teu nome farei morada do suspiro e de vertigens de magma… Depois, sempre que os teus gritos de fome devorarem no espaço as barreiras do silêncio, na concha das mãos, como quem acolhe o possível voar além, deixarei nidificar penas brancas, o luar e o eco da brisa que ao adormecer me afaga os segredos que na língua te reservo, e a origem das salivas geminadas… Mas hoje, nada mais sou do que o fumo das chamas donde me chamas…

PBC

terça-feira, 25 de maio de 2010

Este país é um espectáculo...

Foto PBC



Este país é um espectáculo…

Não, não venho falar do rombo no BPN e das suas consequências na economia contributiva, nem das que se sabem, pelo menos quarenta e cinco crianças vitimas diárias de maus tratos e abusos sexuais, nem do facto de, como se muitos mais houvessem, sermos o vigésimo sexto país da Europa no que respeita à qualidade dos serviços de saúde, nem dos puníveis pavoneando impunemente as suas calotes, nem do discurso das Manuela Ferreira Leite nas soluções para o ensino, nem do vale e Azevedo, nem de outras misérias semelhantes, porque isso não interessa a ninguém e já é passado.

O presente, uach, de diferente ,só mesmo a vovuzela.

Mas pronto, adiante, venho, isso sim, falar da minha mais recente descoberta que, para além de mim, também não interessa a ninguém.

Sabem que Portugal é uma referência no minimalismo, na arte do minimal? Pois, claro que não sabem. Eu próprio, até ontem, desconhecia por completo esse facto.

Para que entendam, importa falar-vos da minha mais recente aventura que não foi pôr-me a jeito nos novos acrescentos da IC 16, essa obra prima da engenharia e planeamento rodoviário; enfiar-me nos túneis do metro de Lisboa, isso sim é aventura.

Sim, como costumeiramente, após o fecho dos filmes e entrega da viatura, impondo-se o regresso ao lar, uso apanhar algum transporte.

Ontem, ao contrário do tempo das vacas gordas, e porque as vacas permanecem mas ao invés de nos darem alimento tentam biscar-nos o pão e o leite, em vez de apanhar um táxi, decidi-me pelo metro. Ora, qual não é o meu espanto ao ser repentinamente confrontado com aquela recorrente frase que usa povoar-me os impropérios que costumo atirar ao vento, quando, uma vez mais, concluo que Portugal, ainda que bem o tentem, não é um país talhado para o turismo, mas exclusivamente para quem o conhece. Sou mesmo tentado a pensar que, apanágio da nossa desconfiança típica, construir um país tão enredado em labirintos, falta de indicações e rotundas tão retorcidas que nos trocam os olhos, fazê-lo está na base da segurança nacional e da precaução às invasões inimigas. Qualquer força de ataque que nos invadisse, depois de perder o norte, ou entrar em depressão logo na primeira rotunda ou diante da primeira placa de sinalização, desistiria imediatamente de se querer entrincheirar neste nosso pequeno Portugal. E porquê, somente porque somos os mestres do minimalismo. Ele é o mínimo de informação possível referentemente a acessos, a contas públicas, a informação burocrática, ele é placas colocadas tardiamente em cima dos desvios, ele é o que se papagueia e não se vê; em fim; ele é o que na realidade se traça e não se nota.

Bem, mas dizia: Chego eu ao metro, procuro indicações que me conduzam a bom porto, e que vejo eu? Setas com caravelas, gaivotas, tudo muito lindinho, minimal e “depuradamente” engendrado, apontando a direcção da última estação, mas só para quem sabe que é assim. E o mapa do traçado das linhas? E o mapa do traçado das linhas?!! Que nem um ignoro na minha própria terra – porque na dos outros nunca me perdi – de olhar esbugalhado e tentando focar além dos olhos em bico, perscruto à direita e à esquerda, reparo no olhar piedoso dos que dominam a situação, ainda ouso considerar se não serei ainda o artolas que querendo ir para o Carregado foi dar a santa Maria da Feira, mas cedo concluo que não, e que, para não dar por fácil o regresso a casa, tenho que descer a uma plataforma à escolha, e se por ventura não for a correcta, lá ter que subir e descer de novo as escadas, porque o tal do mapa só existe mesmo nas plataformas ou ao alcance de olhares distraídos que por mero acaso os desencantem.

E se desencantem é o termo, perante esta ordem de factores não será desencantado o meu sentimento nacionalista.

Mas que aquela sinalética minimal fica bem na paisagem, aí disso não tenho dúvidas.

PBC



És palavra de cristal que se refaz no reverso do olhar humedecido

reflectindo o toque com que na ponta da língua semeias fantasia

ou a espuma do mar esquecendo vagas de tempestade

o doce marulhar das pequenas ondas alisando num único embate a falésia escarpada

o silêncio mimado que esconde a ofegância dos sentidos duplamente despertados

no abraço estendido

o mistério secular

que se entrecruza no tempo em que os olhares passados falavam de presente

a casa que se larga sem se deixar de voltar para chegar e partir para nova viagem

o circulo que antecede o espaço projectado pelos dedos que se tocam bravios

e a fada

que ao respirar à superfície da pele o nome das horas

guarda no ventre as cores da aurora por inventar

E és essência

os caminhos estrelares amanhecendo-me no galope do sorriso alargado

o lume brando atiçado solenemente pela exactidão do sopro dos elfos vagabundos

o virar sem pestanejar mais uma página ao coração escancarado

as teclas do piano ressoando no crepitar da madeira empilhada ao canto das bocas de mel

e os passos descalços gastando o frio aos soalhos por varrer

o gesto rasurado que recompõe o leito à chegada do ósculo

e um não sei que nome dar ao suspiro

já que és

o pouco mais saber

do que o saber que estou

ou que não estou

se por acaso não acordo

em ti

PBC

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Porque se compartimenta o universo...



Quem por senti-la lhe chega, certificando-se de conhecer não a verdade sobre mas apenas a verdade, quem sabe se a essência de ser-mos, porventura o derradeiro reduto com propriedade bastante para, dispensando motivos, chamarmos-lhe casa onde pacificamente caminhar-mos nus, descalços e livres, sabe não haver razão na verdade ou sequer existir silêncio numa troca de olhares espelhando a única condição que importa, que é a de ser-mos; e sabe, sem necessidade de codificá-los para os comunicar, sabe ter a mesma valência tanto um sorriso como uma lágrima, tanto o ter-se tudo como o nada se ter, tanto o estar como o partir, e tanto o estar verdadeiramente vivo como, quem por está-lo, sabe morrer.

Por isso te digo que, para ser onde tão-somente me és existes aonde nunca deixei de te ser, e que é urgente mergulhar até onde palavra alguma me encontre em ti e só a essencialidade de me despojar de mim conduzirá à única verdade residente na satisfação duma lágrima: O bastar sentires donde nasce tudo o que te sou…

Porque se compartimenta o universo sempre que se fundamentam verdades, ou, divinos, o amor…

E é isto que encontro em filmes como o Gladiador, o Brave Heart, ou o Instinto, filmes que contrapõem a dualidade do que sabemos ser a nossa própria justiça, e me falam do sentir e viver a coragem de ser-mos o que, dispensando terminologias, poucos ousam conquistar, e, por senti-lo como próprio, a quantos faz chorar…

Digo-te ainda não existir legitimidade em verdade nenhuma que não nos mostre quão carente é a felicidade do choro… e que ilusória é a razão do verbo…

Tudo o mais saberás ao chorá-lo…

PBC

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Penso nisto...



Está tudo doido.

Já não se trata de crise mas da falência deste modelo de educação social em que ensinar a lutar pelos direitos e legitimidades individuais e colectivas é substituído pelo precoce incentivo ao engolir sapos vivos.

Está mesmo, está tudo doido. E o mais engraçado é que nos iludimos com o facto de nos ser mais vantajoso o escapismo do que olharmos de frente para as consequências generalizadas que tal acarreta quer para o indivíduo quer para o colectivo.

Chamando os bois pelos nomes, esta não é uma falência dos sistemas imposta exclusivamente pelos órgãos de decisão e pelo poder das instituições mas sobre tudo uma falência com a qual pactuamos logo desde a sua gestação, porque nos complica compreender que a canalhice e injustiça reinantes só são possíveis na medida em que, para manter e alcançar poder, status, proveito, ou mesmo, em ultima instância, garantir sustento, acobardarmo-nos diante da verdade e refugiarmo-nos no mutismo torna-se moeda de troca mesmo que nos conduza à frustração e revolta silenciosa. E isso paga-se com depressões e outras pandemias mentais e emocionais em crescente proliferação.

Engraçado também é o facto de que na maior parte das vezes, quando se narra a realidade dos factos, os que lhe dão convictamente forma negativa consideram estar-se a falar mal deles. De facto isto é esquizofrénico, quer dizer, perverso. Sempre pensei que pelo falar-se a verdade acerca de alguém se estava a legitimar as suas pretensões e a enaltecer as suas capacidades de levar por diante aquilo em que acredita. A única explicação encontrada para não ser assim é que, tal como nas fábulas, enquanto os lobos se conseguem manter disfarçados de cordeiros vão conseguindo comer o rebanho. Queixamo-nos de haver uma perversão de valores mas somos nós quem na realidade os perverte, porque nos ensinam o conforto das suas vantagens mesmo que se virem contra nós: Suicidários acalentando o desamor para com os nossos educandos e filhos.

Não é de estranhar que, carente de amor , como nunca, a sociedade esteja pautada pelo crescente desenvolvimento de toda uma série de patologias psiquiátricas e pelo desencanto do próprio individuo ao ter-se na realidade.

Por exemplo: O obscurantismo vivido em diversos sectores já não se prende com o facto dos seus actores se defenderem uns aos outros mas, sobre tudo, a si mesmos. Todos sentem mas ninguém ou poucos falam, e enquanto não, independentemente de nos magoar e zangar continua a reinar o abuso, porque, enfraquecidos, permitimos, atirando para terceiros a culpa do que acaba por nos ser concedido. Só que com isso não papo porque os meus pais sempre me disseram ser feio colocar a culpa nos outros, sendo igualmente responsável pelas minhas escolhas, decisões e atitudes.

Vai na volta quem estava doido eram eles.

O mais que sei é que segundo os especialistas o cinismo é uma vertente da raiva que, uma vez atingindo o seu limiar conduz a convulsões. Se se torna cada vez mais difícil pagar psiquiatras não seria mais sensato aprender a cultivar a verdade do que chegar a elas? Se calhar não. Preferimos continuar na cantilena das queixas e choraminguice e a dar desemprego aos psicólogos produzidos em barda.

A sério, devo estar mesmo doido e passei do pensamento à fábula vendo como uma rábula falseadora isto de, se não crescermos no sentido de ser-mos fiéis à verdade nunca teremos a capacidade de ensinar aos nossos filhos o senso de dignidade adveniente da legitimação dos direitos e garantias herdados à nascença.

Penso nisto…

PBC

quarta-feira, 12 de maio de 2010


Não, não falo do sub-mundo ciber-espacial onde, agora, ultrapassada pelas redes sociais a pornografia atinge o seu apogeu e, o vicio solitário – sim, porque é sempre às escondidas que lá se vai; e não digam que não – retira ponta ao viver ao vivo e a cores, mas está na ordem do dia masturbarmo-nos em frente ao computador disfarçando de opinião e partilha de valores, doideiras , fantasias, tristezas ou até a exibição da gata da vizinha em férias nas Antilhas, a sexualidade reprimida disfarçando o mutismo e a solidão em legítimo autismo, que será o mesmo que dizer que é bem viver em duas frentes exteriorizando numa o que por vezes noutra se queda pela mera tentativa.

Benefício dos tempos modernos ou; numa espécie de instinto de sobrevivência em que a máquina como extensão da nossa pele reclama o seu papel no eco-sistema; legítima rebelião contra o individualismo e isolamento para o qual nos empurrou esta sociedade descaracterizada de valores que saciassem as nossas fomes mais profundas.

Mas o que quero mesmo referir é o facto de também ser moda ter um blogg e obliterar a causa da partilha de informação em infindos cortejares do próprio umbigo. E digo-o já sem saber se falo contra mim ou a meu favor, porque em boa verdade agrada-me a ideia de tentar globalizar o que me vai na alma nesta espécie de fecundação autista onde o sémen que daqui sai raras vezes produz petizes que valham a pena. É um facto. De qualquer forma não me consigo abster de analisar segundo a minha própria ordem de ideias esta coisa que para aí anda onde, - e friso que talvez seja só a minha implicância – por vezes mal distingo ter saído de um blogg e ter entrado noutro, tamanha é a semelhança temática, estilística, semântica, ou opinativa: Uma espécie de contra corrente produzindo a corrente do momento. Há de tudo, desde o – ò pra mim na Antárctida até ao - ò prá minha ideia sobre a ideia, sobre o Sócrates ou sobre os Led Zeplin, ou ainda, - Olha, curte lá esta.

É, assim se fode hoje em dia, e, quantas vezes, em última instância, o juízo aos outros. Mas é salutar - penso eu de que – exercitar a retórica umbilical neste pretenso aquiescer de relações extemporâneas com a actualidade, nem que seja para deixar uma indelével marca da nossa passagem pela vida, sem produzir-mos grande coisa, como é próprio da masturbação, zelando, a distintos níveis, pela qualidade do esperma e libido.

Nunca antes afagar o ego foi tão versátil, tão fácil ou possível, nem alcançou ilusoriamente tamanha distinção. Sei lá, acho mesmo que nunca antes se produziu tanto ruído em torno do que quer que fosse, levando-nos ao esquecimento da boa nostalgia de contemplar os enchidos no fumeiro. Enche-se por se encher sobre uma capa de intelectualização, cultura e mundanismo, que, em boa fé, assim se torna, numa cultura de janela aberta apensa a novas maleitas, viroses, e outras oses que tais.

Em fim, vive-se a masturbação sem preconceitos, e com o preceito de se ser para o olhar alheio antes de mais nada, desfrutando de um poder pretendido como descentralizado, mas, também aqui, viciado.

E por aqui me fico, pois, de tanto gostar de me ouvir a mim próprio, esta coisa pode tornar-se patológica.

PBC

sexta-feira, 7 de maio de 2010



É ao revolver o vazio dimensionando o silêncio que se sucedem fantasmas: Imagens que, se trazem o fundo do tempo reverberando-me na memória, desenleiam nadas como quem amarra a eternidade a um rosto sem idade…e futuros onde larguei sombras que o olhar me aprofundam… talvez amor...

...no silêncio...

...larguei às sombras...

...o fundo do tempo...

...em sucessão de fantasmas...

PBC

terça-feira, 4 de maio de 2010

Cena 1



Cena 1 - Ext. DIA / FRENTE AO APARTAMENTO DE SUSANA

Vemos caminhar pela rua um homem com ar de executivo ou empresário, bem aprumado, de fato e gravata, que repentinamente apanha com um ramo de rosas vermelhas em cima da cabeça. Apanhado de surpresa assusta-se e tenta defender-se, fazendo com que o ramo acabe por lhe ir parar às mãos. E olha para cima.

Pelo meio ouve-se a voz de Susana que fala aos berros:

SUSANA
Não és digno de mim; não quero esta trampa pra nada!

PBC

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Palavras cristalizadas...



Porque me incomodam os brancos vazios das folhas dos diários, sem que saiba qual o destino a dar-lhes, antes de as abandonar à solvência e ao destino, uma a uma amontoo ao canto da sala todas as palavras soltas desprovidas de sentido querendo afirmar-se sem consistência na existência de ocultas construções semânticas, precavendo-me talvez para o seu necessário uso em dias quadrados, dos em que aspirar o residual aroma das letras a pouco mais me transporta que a clandestino sorriso espreitando contrito lúcidos universos banais.

Ao abeirar-me delas há uma primeira que me acena. Transformo-a em verbo evoluindo pelo canto das estrelas cintilando na permanência do desejo: sombra de um qualquer musamento vertendo-me tinta na pele dos dedos...

Ajoelho-me junto ao monte e, alí, encostado à parede onde recoloco em caixas seladas todas as feridas resumidas no rasar das asas inflectidas, sorvo a cadência sustida do ar percorrido em alegóricas desfigurações de silêncios decompostos em água. Escolho ao acaso mais duas que, descaídas, me chamam à atenção pela pacatez dos contornos, e num relance aritmético a que faço alhear os gestos empreendo a arquitectura doutro sonho de poema atrasado. Reergo-a na palma das mãos e a sonolência dos mistérios quantificáveis assalta-me como certeza acetinada suportando o pesar dos dias galgados em passo planeado. Traço-lhe a escala e só então me faço compreender em espongica atitude; quiçá vísceras atendendo à urgência do reacerto das horas onde sou palavra tenuemente balbuciada ou esquecida de nela me incorporar pela manhã.

Por isso levanto-me e, circunspecto, rodeio as palavras já quase cristalizadas amontoadas ao canto da sala, aguardando o tempo onde prencher com elas o restante espaço vazio do ideário arrecadado. Beijo a última, a ocasionalmente colocada no topo, e atiro-me abstrato ao leve som das teclas do pc reagindo num esgar de ciúme, evoluindo no branco da camisa donde retirei à pouco o maço de cigarros...Suspiro, mas não sem antes descortinar o nome do termo em falta no monte, já revoltoso pelo mutismo a que eu próprio o obrigo.

E como desconhecido que me pareceu nada lhe chamo. Deixo-o cair.

PBC

sábado, 1 de maio de 2010

Libertando-me...


Já que é no ser estando que falo pelos olhos e deles extraio o início das veredas que ao coração, leve, me conduzem, alimento a harmonia das formas que trago do existir sem tempo ou espaço definido… …

Porque hoje, falar pelos olhos é como cantar pelos dedos e ouvidos e, agigantando-os, navegar pelas cordas duma harpa prolongando o compasso da eternidade nos gestos banais, a eito ao todo, suspendendo-me acima do existir agora: Delicadas pétalas de lótus circunscrevendo a perenidade das certezas guardadas nos fiapos da memória; libertando-me…

PBC