Da minha
janela vê-se cada uma. Ainda não entendi se a estupidez tem causas genéticas ou
se advém da relação com os pais. É que há alguns que são perfeitas máquinas de
fazer a cabeça do filhos em verdadeiros depósitos de merda. Explico: Fumando um
cigarro deparei com um pai a ensinar o filho a andar de bicicleta. Imaculadamente
reluzente a dita, diga-se de passagem. E o cenário prometia. Ora, a criancinha,
na casa dos cinco seis anos, entre
o terror do estampanço e o do que já conhecia de ginjeira, as reprovações do
pai, aos esses avançava uns escassos metros até se desorientar e travar
bruscamente a marcha, com o pai sempre nervosíssimo. Assim que o miúdo tomava
embalo, o pai, qual marine, começava a cantarolar “eu sou um granda ciclista, trálálálalá.
E quando o puto repetida e tendencialmente guinava para a vedação do ringue,
porque é assim mesmo, tendemos a rumar para junto de suporte, ele, aos berros e
resfolegando, gesticulando como uma criança, de punhos cerrados, como se
quisesse arrancar os próprio cabelos, dizia: - Não, não, não, para o muro não!!
E isto vezes sem conta. Numa delas, não me contendo, de cá de cima, para que o
tipo ouvisse, em meia surdina soltei um “grande lição de ciclismo”. Já me estavam a dar os
forniques. O tipo baixou o volume nas investidas contra o miúdo mas a estupidez
do tom manteve-se até que acabou por soltar a frase mágica: - Não, não, não,
para o muro não, porra! Mais vale caíres e estampares-te mesmo do que ires contra
o muro! Depreendo que porque o puto serviria de almofada à bicicleta e que ao
chegarem a casa guardasse a criança na arrecadação e fosse com a bicicleta para
cima. Certamente o mesmo tipo de pai do rapaz que ainda há pouco, depois de
pedir à amiga um cigarro, que a coitada enrolou, se recusava a ir ter com ela
para o receber. Como a miúda se fez de cara e o obrigou a ser ele a ir ter com
ela, o engraçadinho, de bull terrier na trela, em vez de agradecer dá uma
palmada no braço da desgraçada fazendo-a largar o cigarro. Claro está que, por
eventualmente ter a cabeça menos feita em merda ela desatinou e pôs-se logo
dali a mexer deixando-o agarrado à bull terrier. Casos destes têm-se sucedido.
Lembro-me por exemplo da mãe que à saída do parque se virou aos berros para a
filha de cinco anos, vestida do que para mim seria uma reluzente couve roxa
desmaiada mas para ela princesa dos arrabaldes, dizendo-lhe: - Minha grande estúpida,
já foste sujar os colantes e os sapatos; porra! Ora, se o parque é para as
crianças brincarem e se espojarem, porque é que em vez de a vestir de couve não
lhe vestiu um escafandro? Mas também há os outros exemplos nos quais em vez da
simples intimidação e facadas na auto estima o que fazem é fomentar a má educação,
como a mãe que ia provocando e espicaçando o filho de três anos, fingindo
entregar-lhe a bola mas não chegando a fazê-lo, até à irritação da criança que
entre pontapés e socos dos quais a senhora se ria acabou a ser parado com um “vá,
pronto, acabou, sais mesmo ao teu paizinho”. Agora; culpabilizar esses pais por
serem assim? Não coitados, já os pais deles o eram e os pais dos pais também. É
que a merda tende a repetir-se de geração para geração e, tarde ou cedo, tanto
na atitude como nos gostos, nem que a porca tussa, acabamos a puxar às origens.
Quanto a mim acho deveras importante sabermos em que lado do cérebro nos
depositaram a merda, para ou não virmos a sofrer graças ao seu cheiro, no caso
de nos depararmos com quem não esteja para levar com ele e fazer como a miúda
de há pouco ou, se pelo contrario encontrarmos quem esteja, não acabarmos a
intoxicar esse incauto com as nossas merdices. Eu por exemplo sei bem onde e
como a merda me foi depositada. Não sou dos que nesse âmbito considera a
progenitura e ascendência como excelsas divindades sem culpas no cartório dos
meus despropósitos e emoções turvas. Mas poucos são os que o reconhecem o
cheiro da merda que carregam. Até porque o sangue é forte e a lealdade para com
as origens dá jeito em situações de menosprezar o próximo. Portanto, há que
preservar os bons costumes familiares. A mais, o que para uns é falta de educação
para outros é um costume e tradição a proteger. É como os gostos e preferências.
Eu falava de couve roxa desmaiada; não é verdade? Mas é só porque a minha cabeça
também foi bombardeada com merda, poluída com sapatinhos de berloque e
camisinhas de piquet e comportamentos de etiqueta. No fundo, apesar de ter
feito a infância e parte da adolescência de calcinha de fazenda creme e
camisinha azul e risca branca, sei que de gostos são gostos, legítimos, e
sempre inerentes à formação de cada um. Nem melhores nem piores. Somente; no
entender das minhas origens; lá está, pirosos por vezes. É lógico que não se
pode pedir a uma varina que vista a filha como uma tia de cascais vestirá. Nem
vive versa. É mais comum depararmo-nos com aspirantes a tias de cascais a
refilarem com as filhas como varinas e varinas a pretenderem não ver a atitude
das filhas por ser bem entre elas fazer vista grossa à deseducação das crias. Porque
dá status no grupo. Enfim, merdas em prole de famílias felizes. E se não fossem estas famílias felizes, o
que seria dos psicólogos? Se as disfunções psicológicas não se alastrassem aos
outros como uma virose e, por irónico que pareça, não fossem sempre os outros a
ter que fazer terapia para se livrarem das merdas alheias, como se destacavam as famílias entre elas?
PBC